No mês de outubro o calendário litúrgico da Igreja apresenta-nos grandes modelos de santidade, homens e mulheres que caminharam à luz da “alegria do Evangelho”, servindo e amando a Deus e aos irmãos com despojamento e caridade perfeita. Neste mesmo mês, a Igreja no Brasil propõe-nos ainda importantes temas para reflexão, como as missões, recordando-nos a importância da dimensão missionária na vida do Povo de Deus; e a Semana do Nascituro, dedicada ao trabalho de conscientização acerca do profundo e inviolável valor da vida humana desde a sua concepção, bem como os meios que devem ser utilizados para protegê-la e ampará-la. Também damos grande destaque à comemoração do dia de nossa Padroeira, a Padroeira do Brasil, Nossa Senhora da Conceição Aparecida, a quem a Terra de Santa Cruz, nossa pátria amada, é consagrada e a quem, desde já, queremos consagrar o segundo turno das eleições presidenciais.
No mesmo dia em que é celebrada a memória da Senhora do Brasil, a sociedade civil comemora o Dia das Crianças, data especial cuja importância consiste no reconhecimento da dignidade de cada criança e na necessidade de ampará-las e de oferecer-lhes as condições mais fundamentais e, por conseguinte, essenciais para o seu desenvolvimento, a começar pelo direito à vida desde a sua concepção. Quanta incoerência existe em uma sociedade que, mesmo buscando salvaguardar os direitos das crianças, viola os direitos do nascituro, do mais indefeso, propondo políticas públicas como a discriminalização do aborto!
Entretanto, nossa reflexão é dedicada àquela que abre o mês de outubro com o seu dia e que, talvez pela sua imensa discrição e humildade, passe despercebida aos nossos olhos: a petit (pequena) de Lisieux, Santa Teresinha do Menino Jesus e da Santa Face. Sim, o grande mês de outubro inicia-se com o dia da pequena monja carmelita, doutora da Igreja, padroeira das Missões e a co-padroeira, junto a Santa Joana D’Arc, da França. Pequena, pois no Reino de Deus é grande, paradoxalmente, aquele que se faz pequeno. E como ela soube fazer-se pequena, tornou-se, pela graça de Deus, grande diante de seu Esposo, a quem ofereceu-se como “vítima de Holocausto”, a fim de “viver num ato de perfeito Amor”. Pequena como uma criança nos braços de seu pai, ensinou-nos, por meio de sua pequena via, um modo extraordinário, ou melhor dizendo, ordinário de aproximarmo-nos de Deus confiantemente, entregando-nos, dia a dia, ao seu infinito amor. Assim escreve em sua autobiografia, fazendo referência à pequena via e a sua escolha por trilhá-la: “Sempre desejei ser santa, mas – pobre de mim! – sempre constatei, ao me comparar com os santos, que entre eles e eu existe a mesma diferença que há entre uma montanha cujo cume se perde nos céus e o grão de areia obscuro pisado pelos transeuntes. Longe de desanimar, disse a mim mesma: ‘O bom Deus não pode inspirar desejos irrealizáveis. Logo, apesar de minha pequenez, posso aspirar à santidade. Tornar-me grande, é impossível; devo, pois, me suportar tal como sou, com todas as minhas imperfeições, mas quero procurar um meio de ir ao Céu por uma pequena via bem direita, bem curta, uma pequena via inteiramente nova’.”
A via da infância espiritual de Santa Teresa é o caminho do amor, do escondimento, da negação da vontade própria, do reconhecimento das próprias misérias, mas, sobretudo, da imensa misericórdia do Bom Deus. É buscar corresponder ao amor “daquele que nos amou por primeiro” (cf. 1 Jo 4, 19) em todos os momentos e sob todas as formas, até nos mais pequenos atos da vida cotidiana que, embora possam parecer desprezíveis e insignificantes, carregam em si um incrível potencial de santificação. O amor não consiste na quantidade de obras heróicas e extraordinárias que fazemos a Deus, mas na intensidade de amor com que O amamos através das oportunidades que se nos apresentam no dia a dia: quanto amor a Deus eu coloco nesta ou naquela atividade que empreendo todos os dias? Esta pergunta traduz bem a pequena via, pois amar a Deus é morrer, desde as mais pequeninas coisas, para a vontade própria, tudo fazendo com o único desejo de amar e agradar a Ele.
Ademais, a infância espiritual para Teresinha não significa infantilidade, mas sim, ser totalmente dependente de Deus. Da mesma forma que uma criança confia e depende do seu pai para lhe proteger, cuidar e amparar, assim também deve ser a situação da alma que ama a Deus: o seu caminho é a total confiança em seu Pai.
Como, então, não relacionar a pequena Teresinha com este mês, dedicado também às crianças? A pequena via nos oferece grandes intuições para entendermos uma sociedade que, acreditando em sua autossuficiência, contribui cada vez mais no processo de “adultização” das crianças que, querendo ser adultas e independentes antes do tempo, deixam de viver etapas fundamentais para o seu desenvolvimento. Teresinha propõe-nos justamente o caminho inverso: ser criança, ter um coração simples e dependente como o de uma criança, não se fiando em suas próprias capacidades ou virtudes, mas apenas em Deus. “Se não vos tornardes como criancinhas, não entrareis no Reino dos Céus” (Mt 18, 3): estas palavras de Nosso Senhor traduzem bem a pequena via de Teresinha, pois esta está na essência do cristianismo, no cerne da fé cristã. “Deixai vir a Mim os pequeninos e não os impeçais, porque o Reino de Deus é daqueles que se lhes assemelham” (Mc 10, 14)
Enfim, Teresinha é um fenômeno espiritual que permanece sempre atual na vida da Igreja. A pequena via é a nossa via, é a via ordinária de todo cristão, aquela que nos leva diretamente ao Caminho que nos une a Deus. Que todas as crianças aprendam com Teresinha, que desde a mais tenra idade já manifestava profunda sensibilidade mística e amor a Deus, a trilhar esta “pequena via bem direita, bem curta” e “inteiramente nova” para o Céu.