II – Bíblia: Palavra Humana

Setembro, mês da Bíblia, nesse mês iremos retomar nosso estudo sobre a Sagrada Escritura, para uma melhor compreensão será interessante retomarmos os tópicos anteriores antes de darmos continuidade. segue o link das postagens em que é possível ter acesso a introdução e ao primeiro tópico.  Por Diego Novaes

 

          INTRODUÇÃO                                                            I – BÍBLIA: PALAVRA DE DEUS

biblia sem mitos              Mês da biblia

 

 

 

 

 

  

2. Bíblia: palavra humana

 

Todavia, para escrever os livros sagrados, Deus escolheu e serviu-se de homens na posse das suas faculdades e capacidades, para que, agindo Ele neles e por eles, pusessem por escrito, como verdadeiros autores, tudo aquilo e só aquilo que Ele queria[1].

 

A Dei Verbum no trecho acima citado esclarece que Deus para dar a conhecer sua mensagem fez por meio de homens capacitados e inspirados, por isso, a bíblia também possui em sua natureza a dimensão antropológica.

É certo que Deus ao dirigir-se ao homem o fez por meio de caracteres humanos, pois caso contrário esse não o compreenderia. Por esse motivo é que se pode afirmar que Deus comunicou uma mensagem por palavras humanas, uma vez que a linguagem divina é indescritível em linguagem humana. Assim sendo, a mensagem divina é revestida como que em “roupagens humanas” para que ao homem seja acessível e este a compreenda. A linguagem divina expressa na linguagem humana.

 A Bíblia é então uma fonte de Revelação, um meio, e não a Revelação em si. Já que a Revelação é uma linguagem pela qual Deus se expressa e deixa se conhecer e também a seu projeto, a bíblia fala dessa Linguagem, por isso qualificada como Palavra de Deus, conclui-se que ela é Palavra de Deus em Palavras humanas.

Para que essa palavra chegasse a se tornar uma compilação de livros sagrados, antes passou pelo mencionado processo citado anteriormente. Para que se tenha uma boa compreensão dos textos é necessário levá-lo em consideração, para tanto este será agora apresentado.

 

3. Processo de formação da Bíblia: etapas da Revelação

 

A bíblia não foi gestada do dia para a noite. Sua formação seguiu um processo, um caminho complexo até chegar neste livro tal como se apresenta. Abaixo segue um esquema que permite visualizar de maneira sintética esse processo.

 

esquema-biblia

 

Deus é que em sua livre decisão Revela-se ao homem transmitindo sua mensagem. Ele o faz dentro de um acontecimento. De certa maneira tudo o que está contido na Escritura Sagrada teve seu ponto de partida em algum acontecimento ou experiência vivenciada por algum povo, grupo ou pessoa. Acontecimento esse que foi interpretado por quem ou pelas pessoas que o experimentaram. Interpretar é buscar o valor ou o sentido do acontecido. Vale lembrar que toda interpretação é subjetiva. Quem os interpreta está inserido dentro de um contexto, cultura, possui outras experiências que acabam por influenciar sua visão e maneira de compreender o dado. E como o relato fora transmitido oralmente ao longo dos anos antes de ser redigida, esta certamente sofreu mudanças através do tempo. Quando o acontecimento era de singular importância esse era transmitido a outros. Para tal era necessário que ele fosse formulado em uma linguagem compreensível ao destinatário, caso contrário não haveria comunicação e assim a compreensão estaria comprometida. A formulação era em linguagem humana e não divina, portanto, a mensagem era colocada em caracteres humanos, em uma linguagem. Essa linguagem era própria de cada período, nação, ou seja, de um povo que possui uma cultura, com história e costumes. Com isso as narrativas e a escrita do texto inspirado entram em contato com muitas expressões, vontades, desejos e anseios da comunidade a qual ela foi revelada.

Após ser interpretada e formulada a mensagem é transmitida oralmente ou pela escrita. Porém, quando se transmite uma mensagem e ela vai sendo retransmitida de A para B, de B para C e assim por diante, a mensagem ao ser acolhida é interpretada e compreendida pelo receptor de certa maneira e este por sua vez quando transmite a outro a mesma mensagem este certamente a partir de sua interpretação terá modificado o conteúdo (pode tirar, acrescentar, atenuar ou alterar elementos). Mas o que de fato é importante é conservado, o que geralmente não tem ou perde importância é retirado ou cai no esquecimento, portanto, o que está na bíblia por conter a mensagem válida foi considerada importante e significativo permanecendo na transmissão. A essa transmissão dá-se o nome de tradição.

Em dado momento o que era transmitido pela tradição oral, os relatos de maior importância e significado foi redigido pelo último na linha da transmissão oral (o autor literário), e passaram a serem transmitidos pela tradição escrita. Percebe-se então que a Sagrada Escritura surgiu dentro de uma Tradição. A tradição é anterior a Sagrada Escritura, sem ela a Escritura não existiria, a existência da Bíblia depende da Tradição, portanto, é possível afirmar que a Bíblia é fruto da tradição. Diante disso, deve se evitar suprimir a Tradição para que não se rompa com o elo que sustenta a Escritura. Apenas com base na Tradição é que se pode interpretar corretamente as Escrituras Sagradas, pois, se eliminar a Tradição, há o risco de cada um interpretar à sua vontade o conteúdo das Escrituras. Hoje a Revelação chega aos fiéis por meio da Sagrada Escritura e da Tradição. Há conteúdos na Tradição que não estão contidos na bíblia, contudo, ambas não se contradizem.

Com o surgimento de diversos textos o povo de Israel, e dentro do cristianismo a Igreja, se viu obrigada a definir quais deles eram de fato inspirados, e assim, serem considerados como normativos. À coleção dos escritos reconhecidos como legítimos dá-se o nome de Cânon, e aos que não foram aceitos de apócrifos. A lista de livros escolhidos para que fossem compreendidos nos diversos lugares em que chegou foi necessário que se traduzisse. Por vezes na tradução era necessário a interpretação dos termos, assim, surgiram diferentes versões, que chegam até o fiéis nos dias atuais. A leitura dos escritos conduz a pessoa a uma nova experiência com aquele que Fala em primeiro nos acontecimentos.

[1] Dei Verbum, §11

 

 

Na próxima publicação iremos estudar o Cânon das Escrituras…

 Por Diego Novaes