Homilia de Dom João Inácio Müller por ocasião do Jubileu de Carvalho, 80 anos de criação da Diocese de Lorena, proferida na Catedral de Lorena no dia 31 de julho de 2017, na celebração festiva das 19h após solene Sessão da Câmara Municipal de Lorena.
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Jubileu de Carvalho – Diocese de Lorena, dia 31 de julho de 2017
O problema de fundo dessas duas parábolas (Mt 13, 31-35) está ligado a alguns dos interrogativos mais profundos do ser humano, ontem e hoje, e que eram interrogativos da comunidade para a qual Mateus escreve: por que o bem é tão ‘pequeno’ e até ‘imundo’? Por que o Reino, iniciado com Jesus e em Jesus, recolheu em torno de si tão pouca gente e gente tão insignificante: pobres, marginalizados, pecadores? O que será de um reino que conta com pessoas socialmente fracas e religiosamente desclassificadas?
A comparação do Reino com a semente de mostarda e com o punhado de fermento não corresponde ao imaginário corrente do Reino. De modo geral, o Rei-Reino é imaginado como algo grande, triunfal, poderoso. Imagina-se o Reino como uma grande árvore: esquece-se que esta se desenvolve a partir de um galhinho ou de uma semente. Imagina-se como uma conquista grandiosa do mundo: esquece-se quando a Bíblia fala de um povo de pecadores exilados e do Servo de Deus humilhado.
Nas duas parábolas, Jesus joga com o contraste entre a pequenez da semente e a grandeza da planta, entre o caráter impuro do fermento e sua capacidade positiva de ativar e fazer crescer a massa toda. A insignificância da semente produzirá uma árvore grandiosa; um punhado de farinha ‘apodrecida’ fermenta o bom trigo.
Jesus ensina que faz parte dos mistérios do Reino esse contraste entre a insignificância atual e o esplendor futuro. Entre as duas situações, porém, há uma continuidade real, parecida com a que existe entre a semente e a planta, o fermento e a massa crescida. Paulo vai dizê-lo, sem parábolas, ao escrever à humanidade insignificante de Corinto: ‘aquilo que o mundo despreza, acha vil e diz que não tem valor, isso Deus escolheu para destruir o que o mundo pensa que é importante’ (1Cor 1,18). E São Paulo diz mais: “Irmãos, vocês que receberam o chamado de Deus, vejam bem quem são vocês: entre vocês não há muitos intelectuais, nem muitos poderosos, nem muitos de alta sociedade. Mas, Deus escolheu o que é loucura no mundo, para confundir os sábios; e Deus escolheu o que é fraqueza no mundo, para confundir o que é forte” (1Cor 1, 26-28). Segundo o Deuteronômio, Israel não foi escolhido por suas qualidades, mas justamente por ser ‘o menor dos povos da terra’ (Dt 7,7). Manifestam-se aí a liberdade de Deus e a nossa libertação: liberdade de Deus, porque é amor, e o amor se faz pequeno e humilde; nossa libertação, porque somos pequenos e, assim, somos libertados de nossa mania de grandeza.
O Reino tem a cara do seu anunciador. É pequeno como ele. É como a sementinha de nada misturada ao pó do chão. É como o tiquinho de fermento que a cozinheira joga na farinha. Quem não entende esses falares simples, estas comparações luzeiras? Assim, o Reino fala da vida e a vida dá fala ao Reino. O Reino é pequeno, mas forte e corajoso: tem o Espírito.
Nós, esta Igreja particular, esta Diocese de Lorena, vejo-a, como a semente de mostarda e o fermento: nós não somos fortes e nem potentes, não somos grandes luzeiros, mas, graças a Deus, temos nossa luz. Somos um povo de fé, temos nossos santos e santas, nossa cultura e nossas piedades, abertos ao Espírito Santo, e, por isso, sim: somos valentes. Assim tem sido os Bispos, os Presbíteros e os Diáconos, pastores das nossas Paróquias e dos nossos Santuários; assim foram e são nossos consagrados e consagradas, nos vários carismas, dons do Alto; assim foi e é nosso povo, com suas lideranças de fé. Nós não queremos e não podemos nos orgulhar de nós. Mas, sim, de Deus. Deus conosco, e por meio de nosso trabalho, faz o seu Reino cintilar. Assim, pela ação do Espírito Santo, somos uma Igreja pequena, mas solar. E isto é graça de Deus, e graça de Deus que em nós vingou e vinga, como a semente, como o fermento.
Neste dia, 31 de julho, dia em que, com toda a Igreja, fazemos memória de Santo Inácio de Loyola, a Diocese de Lorena, solenemente, celebra seus 80 anos de Criação. Diante do Senhor depositamos o dom multiplicado; confiado desde a origem a nós, a esta porção do povo de Deus. Tudo é Dele, tudo é para a maior glória de Deus, e o amor é a glória de Deus. Assim, damos a Deus o amor, nosso amor, o amor-serviço-doação-entrega, na fé, de nossa história, de nossos antepassados, de todos e de cada um. Tudo depositamos no Altar. Tudo, com amor reverente, depositamos no colo de Nossa Senhora da Piedade, Padroeira de nossa Diocese.
Para celebrar este Jubileu, foi confeccionado um livro: “Diocese de Lorena 80 anos – A fé se faz devoção e habita no meio do povo”. Este livro busca nos sensibilizar com a nossa história, com nossas origens e com a cultura de nossos pais na fé. Deixo ecoar algumas frases deste livro, frases portadoras da vida da nossa Igreja, do nosso povo de Deus, da sua fé e piedade.
O Evangelho se encarna em comunidades vivas, comunidades negras, indígenas, camponesas, urbanas, em realidades autóctones, adquirindo cores, cheiros, expressões, rituais que possuem o jeito característico de cada povo – Prof. Rodolfo Fenille Ferraz
O senhor Laurentino Gonçalves Dias Júnior, um dos organizadores do livro, escreve:
Conheci a Igreja do povo. Nosso povo, com sua fé, se diz nas suas devoções. Lemos a fé pelas expressões de devoção e caridade. Neste livro busca-se ressaltar a importância do povo, sua cultura e tradição, para o entalhe da feição da Diocese. Feição esta que revela sua essência, sua personalidade particular e coletiva, e afirma sua relevância como comunidade de comunidades.
Dom Eduardo Benes de Salles Rodrigues:
Declaro minha gratidão a Nossa Senhora da Piedade. Declaro minha gratidão aos padres e diáconos, dos quais recebi imerecida e generosa acolhida. Fica muito viva a lembrança de nossas reuniões e das visitas pastorais, sempre muito frutuosas, iluminadas pela alegria do povo. Gratidão aos religiosos e aos leigos e leigas que colaboraram decididamente na administração e nas pastorais, permitindo melhor articulação na dinâmica de nossos empreendimentos. Gratidão a Dom Antônio Affonso de Miranda e a Dom Benedito Beni dos Santos pelo generoso pastoreio exercido em favor do povo, nessa amada Igreja.
Dom Benedito Beni dos Santos, nosso Bispo Emérito, escreve:
Esta celebração está sendo realizada num momento em que se alarga o horizonte evangelizador da Diocese: o cunho missionário do Seminário e a belíssima iniciativa de enviar sacerdotes missionários para outras dioceses. Creio que essa iniciativa é a mais significativa comemoração do aniversário: oitenta anos de existência da Diocese de Lorena.
Concluo, dizendo e rezando: “Tudo é teu, Senhor. Acolhe nosso amor”.
Dom João Inácio Müller, Bispo diocesano